Antes de “Pôneis Malditos”, quatro vídeos da Nissan foram parar no Conar
Ao fazer comparações com produtos da concorrência, comerciais já foram tirados do ar pelo conselho; para especialistas, estratégia é um sucesso
Por Carolina Guerra da Veja
Nos últimos dois anos, a montadora japonesa Nissan já teve nada menos que quatro comerciais tirados do ar por determinação do Conselho de Autorregulamentação Publicitária, o Conar. Seu mais novo vídeo, “Pôneis Malditos” é outro que se torna alvo da análise do órgão. Trinta reclamações encaminhadas ao conselho apontam que a peça publicitária pode ofender as crianças ao associar a imagem dos pôneis – presente em desenhos animados e linhas de brinquedos – a uma palavra de caráter pejorativo. Para a Nissan, porém, isso não parece ser problema.
Murilo Moreno, diretor de marketing da montadora, afirma que, se for necessário, tirará o vídeo do ar. “Não acho que isso faça sentido, mas, se for proibida, vamos acatar como sempre acatamos”, disse. Essa aparente tranquilidade tem um motivo: o comercial já é um estrondoso sucesso. Lançado na semana passada, “Pôneis Malditos” é o vídeo mais visto no Youtube em todo o mundo nos últimos sete dias – conforme medição realizada nesta sexta-feira pela ferramenta “charts”, do próprio portal de vídeos. A propaganda é também uma das mais comentadas na internet, citada milhares de vezes nas redes sociais, como Twitter e Facebook. A estimativa é que cerca de 100 milhões de pessoas tenham visto à campanha.
A opção por vídeos de “risco” é clara no planejamento de comunicação da empresa. “A marca começou com uma estratégia comparativa clara e direta, com peças publicitárias que citavam explicitamente os nomes dos concorrentes”, lembra Márcio Oliveira, vice-presidente de operações da agência de publicidade Lew’Lara\TBWA, que fez os vídeos. Uma das propagandas mais polêmicas da japonesa ataca outra montadora num ponto muito sensível: o preço. No vídeo, dois rappers divertem-se com o dinheiro “a mais” pago por supostos consumidores que teriam adquirido o carro da outra marca – e não o Nissan Tiida, do mesmo segmento e que, supostamente, teria um preço menor. A empresa foi obrigada a suspender a veiculação do filme e chegou a retira-lo, inclusive, do Youtube – ainda é possível, no entanto, assisti-lo, mas em páginas de outras pessoas.
Estratégia – É claro que não faz parte da estratégia primordial de nenhuma empresa ter seus comerciais bloqueados pelo Conar, já que isso implica investimento perdido. A Nissan argumenta, contudo, que a publicidade agressiva foi a saída que encontrou para que sua marca estivesse presente na mente do consumidor. Segundo a empresa, até recentemente, grande parte dos potenciais clientes só se lembrava de seus modelos depois que tinham comprado um carro da concorrência. A solução então foi apelar para a comparação direta, citando marcas, modelos e preços de veículos de outras montadoras.
Uma política sistemática da Nissan é instigar o uso das redes sociais. A tomar pela repercussão de “Pôneis Malditos”, a opção mostra-se acertada. Em 1º de agosto, a expressão com a expressão #tuiteumfilmecomponeis apereceu no ranking mundial de assuntos mais comentados do Twitter (trending topics). No final do vídeo, um dos pôneis se transforma em um animalzinho diabólico, com voz assustadora, e que roga uma praga: quem estiver assistindo e não repassar o vídeo a dez pessoas ficará com a música tema do comercial grudada na mente. “Foi uma estratégia simples, criativa e, ao mesmo tempo, ousada. Os estrategistas de internet quebram a cabeça pensando em como fazer vídeos virarem um sucesso. Eles simplesmente pediram, com humor, para que o vídeo fosse repassado”, observou Guilherme Rios, especialista em marketing social e diretor executivo da agência Social Agency.
De acordo com informações da Nissan, ao veicular um vídeo na TV, no horário nobre, estima-se a média de que 50 milhões de pessoas vejam o anúncio. A questão é que estas pessoas veriam a propaganda de qualquer jeito, sendo ela boa ou ruim. Muitos esqueceriam de imediato. Na internet a situação é outra. As pessoas assistem porque querem, e se gostam, comentam, ativam recursos de compartilhamento – como o "curtir" do Facebook –, recomendam aos amigos, etc. Se o intuito é ser lembrado, a saída mostra-se lógica. A montadora japonesa – que ocupa o 12º lugar em vendas no mercado brasileiro – garante, inclusive, que “Pôneis Malditos” já se traduziu em mais visitas às suas 112 concessionárias no país.
Deslize – Outra experiência da Nissan no marketing das redes sociais não foi, entretanto, tão bem-sucedida. Uma campanha no Twitter prometia um carro a quem conseguisse fazer com que um tweet (mensagem) fornecido pela montadora fosse replicado por seus seguidores um determinado número de vezes. A mensagem dizia: “Se eu conseguir 44.500 retweets com esse tweet ganho um carrão. www.nissan.com.br/queromeucarrao #queromeucarrão”. O problema é que se desconfia que um especialista em internet criou um programa (um robô, no jargão dos programadores) que invadia perfis de usuários e publicava a mensagem automaticamente. “Não temos nada provado, mas também não estava previsto no regulamento de que não se poderia usar mecanismos eletrônicos para burlar o sistema. O jeito foi dar dois carros de prêmio”, contou Moreno, do marketing da Nissan.
Mudança – O filme com os pôneis marca uma mudança na estratégia da empresa. Os publicitários da Lew’Lara\TBWA optaram por se referir à concorrência – cujo motor não tem cavalos de potência, mas sim pôneis de potência – de maneira apenas indireta. “Filmamos de um jeito que ninguém consegue identificar qual carro usamos”, revelou o publicitário Márcio Oliveira.
Pode ser que isso aumente as chances do vídeo ficar no ar, pois, desta vez, as reclamações não vêm da concorrência ofendida pela comparação direta. O Conar terá de avaliar pleitos de consumidores (provavelmente pais de crianças pequenas) preocupados com a associação dos pôneis com uma palavra considerada pesada. Quem vai julgar o mérito da questão no conselho será um grupo de publicitários – categoria que raramente se mostra conservadora. A expectativa é que a peça não será barrada. Especialistas do setor argumentam que, caso o Conar estivesse realmente preocupado com o filme, a suspensão já teria sido ordenada.